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Jesus dizia a todos: "Se alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome diariamente a sua cruz e siga-me. Lucas 9:23.

28 fevereiro 2011

Faz Parte do Meu "Show"


O “espírito” do hebreu é um “espírito” errante, desalojado, sem solidez, desarraigado, livre. Ele não permite que se cavem estacas profundas ou que se construam armações de concreto. O hebreu é viajante, é caminhante da terra, é ser sem destino, homem de tendas, construtor de altares. Tal como a brisa que passa, ou a pegada que se apaga na areia enquanto se caminha, assim é o hebreu, um caminhante da existência.

Eu não sou filho de Abraão, não pertenço a nenhuma das 12 Tribos, não possuo o “DNA” dos israelitas, não estou incluído nas Promessas, contudo, fui enxertado na “Videira” e convidado ao “banquete”, pois me tornei filho e herdeiro de todas as coisas mediante a fé em Jesus de Nazaré. Desta forma, passei a fazer parte da Família, recebi do mesmo Espírito, bebi do mesmo “cálice”, fui crucificado na mesma cruz e batizado na mesma morte, ressuscitei mediante o mesmo Poder e, tendo nascido de novo, recebi o desafio de andar como caído redimido.

Quando eu achava que tudo já havia se acomodado dentro em mim, que as “pedras” do caminho, todas elas, já haviam sido recolhidas ao abrigo, chegou à hora de levantar novamente a minha tenda e me lançar ao sabor do vento. Depois de tantos anos, pensei que havia encontrado um porto seguro. Mas aquele que veio morar dentro de mim me chamou a novas paragens e a novos desafios.

Foram 14 anos desde a última “mudança”. Tempo de crescimento, tempo de dores. Aliás, sem dores não se cresce, não se amadurece, não se expande nem a mente nem o coração. Foi um tempo de conhecimento, de preparação, talvez, para algo maior. Sou grato por estes anos, por tudo o que eles produziram em mim, cicatrizes de amor, marcas de esperança, tatuagens de sonhos acalentados.

Decepções? Tive muitas... A maior de todas, comigo mesmo. Conheço-me melhor agora, bem mais do que me conhecia antes, sei do que sou capaz, percebo minhas inconcretudes, ansiedades e contradições. O tempo me fez mais fraco, mais manso, mais quebrantado. Um dia destes pensava ser de aço. Hoje, sei que sou apenas de osso. Do pó vim e ao pó voltarei.

Meu amigo André Pessoa me ensinou que crente é feito gato, apega-se a lugares, não a pessoas. De fato, sempre que parti e deixei algo para trás, jamais consegui manter o que dantes havia construído. As amizades se esvaem, os projetos se desfazem, os sonhos se esfarelam como estátuas feitas com areia do mar. Tudo passa, se perde, se esquece, se apaga...

Fiz um balanço dos últimos anos... Para minha tranqüilidade, errei muito mais do que acertei, perdi muito mais do que ganhei, encontrei-me em contradição muito mais do que calcado em certezas. É bem provável que tenha produzido mais lágrimas do que sorrisos, ferido amigos, frustrado ouvintes, decepcionado até os que jamais me conheceram. Servi menos do que deveria, ouvi menos do que poderia, amei menos do que pretendia. Não raro meu discurso produziu apenas eco, pois as palavras não se materializaram no chão da vida. Ergui castelos e vi-os cair diante de meus olhos. 

Mas não é a vida assim?! O que esperava eu? A perfeição? O aplauso? O elogio? O reconhecimento? A unanimidade? Ora, quem sou eu a não ser homem feito de barro, suor e sangue. Quem sou eu a não ser alguém que caminha para dentro em busca de si mesmo. Quem sou eu a não ser um miserável resgatado pela graça, um perdido encontrado pela misericórdia, um desviado perseguido pelo amor, um errante salvo pela fé?

Sou tudo e não sou nada, sou ser por fazer-se, o agora e o ainda não, parte de mim é divina, outra parte é humana, pois, mesmo tendo sido resgatado, ainda existo como condenado, estou preso ao meu próprio corpo, aos seus desejos e paixões, apenas sou livre em minha consciência. No fundo, sou andarilho em busca da eternidade, existente caído almejando encontrar a perfeição, humanidade partida, dividida, viajante em busca de reencontrar a árvore da vida.   

Mas agora virá um novo tempo... Parte de mim vai, outra parte fica. São tantas as partes nas quais me decompus que não tenho mais como juntá-las novamente. Hoje sou metade, estou ao meio, sou fragmento de mim mesmo, fui dissolvido como o sal, dissipei-me, misturei-me ao todo, tornei-me parte da vida, cidadão do mundo, luz que brilha nas trevas, clarão que rasga a escuridão para atormentar o tormento.

Agora deixe-me partir... Chegou a minha hora. Não me diga adeus, não soe clarins, não me mande recados, não me escreva, nem telefone... Não deixe que a banda toque canções de despedida, não solte fogos, não bata palmas, não acene... Deixe-me ir incólume, despercebido, deixe-me ir da mesma forma como cheguei, sem ser notado, percebido, destacado.

É assim que sou e, provavelmente, é assim que serei. As mudanças, creia-me, produzem-se lentamente, levam toda uma vida. Há tanto em mim que precisa mudar que seriam necessárias dezenas de vidas para que fosse eu alguém melhor do que sou. Mas, como só tenho esta vida para viver, aquilo que sou está se projetando para o dia em que as minhas incertezas e medos serão confrontados com o “Totalmente Outro”. Aí, então, verei não mais por espelhos, com os olhos embaçados, mas conhecerei como sou conhecido, pois o verei face a face, Ele será o meu Deus, eu serei o Seu filho. 

Desculpe por tudo e por nada. Aceite-me como sou, errante, as vezes perto, as vezes distante, semeador de sonhos, adorador do sagrado, construtor de altares, profeta do cotidiano. Sim, aceite-me assim, pois tudo isto “faz parte do meu “show””, é a forma que tenho de te mostrar que sou humano, que sou o que sou.

Carlos Moreira 

25 fevereiro 2011

Crer no Chico é Chique


Introdução

Tratado como culto ou religião, o espiritismo é um conjunto de doutrinas que admitem a possibilidade de comunicação com os “espíritos” através de pessoas sensitivas – médiuns. Do ponto de vista da “ciência” estuda a origem, natureza e destino destes “espíritos” e sua relação com o mundo material. Analisado pelo viés filosófico, as manifestações além túmulo tem como objetivo desenvolver nos seres humanos conceitos morais que desdobram-se em proposições ético-comportamentais as quais tem, como fim último, levá-los a entender de onde vieram, para onde irão e, por exemplo, o porque da dor e do sofrimento.    

O grande sistematizador do espiritismo foi o pedagogo francês Hippolyte Léon Denizard Rivail que adotou, mais tarde, o pseudônimo de Allan Kardec. Poliglota, estudioso do magnetismo de F.A. Mesmer, Kardec fez parte do cenário cultural e intelectual francês do século XIX. Suas experiências com os “espíritos” iniciaram-se em 1855. A partir de então, passou a freqüentar sessões semanais e a fazer anotações e catalogações dos fenômenos que presenciava.     

Mas foi só em 1856 que Kardec obteve uma “comunicação particular” com um “espírito” que dizia ter vivido com ele há vários séculos atrás nas antigas Gálias, sendo eles druidas – pessoas encarregadas do ensino jurídico e filosófico dentro da sociedade celta. E foi assim que, logo em seguida, em 18 de abril de 1857, Kardec lançou o Livro dos Espíritos, um dos mais importantes até hoje dentro da doutrina. Na verdade, ali nascia a religião espírita.

Expansão e “Acomodação” Social

No início do século XX, a doutrina já era bastante popular no Estados Unidos, onde, curiosamente, foi assimilada pela maior parte da elite econômica dos grande centros. Usando práticas até então desconhecidas, como seções mediúnicas em mesas, demonstrações de ectoplasma – vestígios materiais da presença de espíritos – e até magia, o espiritismo passou também a atrair a atenção da classe média, que começou a interessar-se pelos seus métodos.

O surgimento no Brasil se deu no final do século XIX. Sua maior popularidade, todavia, foi atingida na primeira metade do século XX. O espiritismo brasileiro desenvolveu algumas características bem peculiares, entre elas o sincretismo com as religiões afro-brasileiras, o que acabou por constituir-se numa ponte de mediação entre as classes mais abastadas, que discriminavam tais práticas, e até o próprio Estado.

O escritor espírita francês Leon Denis afirmou certa vez: "espiritismo não é a religião do futuro, mas o futuro das religiões". No Brasil, a frase poderia ser considerada “profética”. Com o passar dos anos, o número de espíritas e simpatizantes da doutrina cresceu substancialmente. Hoje já é possível encontrar um sem número de centros e associações espíritas espalhados por todo o território nacional.

Assim como nos EUA, no Brasil a doutrina espírita encontrou acolhida entre as classes mais desenvolvidas, sobretudo a classe média. Um dos motivos para tal adesão é o fato – talvez único – de que o espiritismo não é uma religião excludente nem fundamentalista, pelo contrário, extremamente liberal, ou seja, ele pode ser praticado conjuntamente com outras crenças sem qualquer problema. Por isso, é muito comum você ouvir pessoas responderem sobre sua filiação religiosa da seguinte forma: “sou católico e espírita ou, sou adepto do candomblé e do espiritismo”.

Outro fator que explica a penetração nas classes mais privilegiadas se dá também pelo fato de que elas são mais instruídas. As doutrinas espíritas lidam com questões tais como: vida pós-morte, volta do mundo dos mortos, levitação da alma fora do corpo, materialização de “espíritos”, clarividência, psicografia, dentre outros “fenômenos”, alguns supostamente tidos como cientificamente comprovados, os quais exigem um maior grau de esclarecimento para serem compreendidos.

Todavia, de todas as questões tratadas pelo espiritismo, talvez a que mais atraia a classe média seja a que estabelece a doutrina da reencarnação. De acordo com esse pressuposto, todas as pessoas vivas são reencarnações de outras que já morreram, ou seja, apesar de estarem vivas novamente em um novo corpo, receberam o mesmo espírito que havia estado encarnado em alguém anteriormente.

Assim, por sucessivas reencarnações, os “espíritos” vão evoluindo, tornando-se mais capazes e com uma maior densidade mediúnica por terem purgado, na existência anterior, o mal que fizeram através do corpo em vidas passadas. Desta forma, “espíritos” reencarnados são o resultado da evolução não somente espiritual, mas também ética, moral, social e material de alguém.  

Ora, confrontada com a “doutrina cristã”, sobretudo a herdada do catolicismo ibérico, recheada de dogmas e crendices e que preconiza a pobreza e o sofrimento na Terra como desejo de Deus, e projeta os usufrutos da prática religiosa só para a eternidade, à doutrina espírita se torna muito mais atrativa e palatável, pois, por intermédio dela, os benefícios da religião são para o aqui, o agora e o depois.

Atenção: A Luz Vermelha Acendeu faz Tempo...

Segundo dados da revista Época, “o espiritismo vem crescendo no Brasil, principalmente entre jovens da classe média. A Doutrina cresceu cerca de 40% entre os últimos dois Censos. Os dados do IBGE mostram que esse crescimento se deu principalmente nos estratos mais ricos e escolarizados da população. A renda dos Espíritas é 150% superior à média nacional, e 52% deles ganham acima de 5 salários mínimos. Entre os espíritas, 77% têm entre 8 e 15 anos de escolaridade, dez anos em média a mais do que os católicos”. Revista Época.

Os números do censo de 2010 quanto à prática do espiritismo ainda não estão disponíveis. Todavia, oficialmente, o IBGE afirma, com base em dados de censos anteriores, que existem no país cerca de 2,2 milhões de espíritas, ou seja, 1,3% da população. Não obstante este número, diversas pesquisas de institutos e outros meios de comunicação apontam para algo em torno de 20 milhões de seguidores, sendo que a grande maioria destes enquadram-se naquele grupo dos que mantém ainda uma segunda religião. 

Outro dado importante diz respeito à distribuição demográfica. Os espíritas brasileiros concentram-se nos estados mais ricos da federação: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília e Rio Grande do Sul. Só para se ter uma idéia de sua influência, em 2010 foram comercializados treze milhões de livros espíritas no Brasil; somente o médium Chico Xavier teve, nos últimos anos, cerca de 35 milhões de livros vendidos. Esses números acentuam-se cada vez mais impulsionados pela mídia escrita, pela televisão e, mais recentemente, pelo cinema.

Também é fator de grande influência sobre a população a adesão, cada vez maior, de celebridades que, publicamente, divulgam praticar alguma doutrina espírita. É o caso, por exemplo, da modelo Raica, do tenista Guga e da atriz Cléo Pires. É justamente esse tipo de publicidade que atrai cada vez mais os jovens para a prática da religião.
 
E os Cristãos, por que tem Tanta Dificuldade com a Doutrina Espírita?

São basicamente 3 as razões que levam o cristianismo a perder, sistematicamente, espaço para a doutrina espírita entre ateus e agnósticos e, não raro, entre seus próprios adeptos. A questão está na constituição daquilo que ele tem como base de toda a sua sistematização, ou seja, seus 3 pilares: ciência, filosofia e religião. Nestes 3 pressupostos, nós levamos uma “surra” dos espíritas.

Do ponto de vista científico, mesmo sabendo que o espiritismo trata questões místicas e metafísicas como científicas, o que é um equívoco, nós agimos de forma ainda pior. Mesmo hoje, existem setores da igreja que teima em manter a eterna resistência de aproximação da ciência. No mundo contemporâneo, esta tem sido uma das principais causas para a não adesão de novos fiéis. Tristemente, o axioma – fé e ciência são incompatíveis – é discurso certo em muitos dos púlpitos de nossa nação.

Ora, este paradigma já deveria ter, há muito, sido superado! Hoje a ciência auxilia a religião em diversas questões e, lamentavelmente, é ela que vem se aproximando da fé, e não o contrário. Estabelecer posições radicais, fundamentalistas, dogmáticas, só serve para nos manter aprisionados a idade das trevas! O protestantismo, historicamente, sempre teve compromisso com o avanço, mas, nos últimos dois séculos, parece ter involuido drasticamente quanto a esta questão.

Do ponto de vista filosófico, a impressão que temos é que a igreja ficou estagnada no século XIX. Parece que filosofia e religião é outra combinação inconjugável para os cristãos. É sabido, entretanto, que a filosofia vem retomando na sociedade contemporânea a importância que um dia teve no mundo antigo e na idade média. Afastar a igreja da filosofia só faz emburrecê-la e embrutecê-la. A filosofia, diferente da religião, está muito mais interessada nas perguntas do que nas respostas, ou seja, ela é questionadora, gosta de perscrutar, de inquirir, de avaliar. Você não acha que, em meio a tudo o que estamos vivendo, isto não seria um exercício maravilhoso em nosso meio? Isto para não lembrar que toda a doutrina cristã está impregnada pela influência filosófica de vários povos, sobretudo dos gregos.

Nossa maior tragédia, todavia, situa-se no campo religioso. É aí onde tomamos mais “pancada”. O cristianismo de nossos dias é verborrágico, ou seja, é falatório puro. Nosso discurso não consegue, nem de longe, se equiparar as nossas práticas e nisso, os espíritas nos dão um “banho”. Além do mais, tem toda esta aberração trazida pelo neopentecostalismo que transformou a igreja evangélica num show de horrores. Citando o professor André Pessoa: “No segundo século da era cristã, os pais apostólicos discutiam entre si sobre a possibilidade ou não de haver salvação fora da igreja. Hoje, a questão inverteu-se e talvez seja mais correto perguntar se há possibilidade de alguém salvar-se estando dentro da igreja”.

Escrevi, em recente artigo, o seguinte: “Quisera eu que a apologética de nossos dias fosse contra o axioma Católico da não possibilidade de haver salvação fora da Igreja de Roma. Isso seria como tirar pirulito de bebê. Hoje lutamos contra nós mesmos, é o chamado fogo amigo, mas melhor seria chamar de fogo estranho! A coisa é tão grave que indulgências e simonias tornaram-se um mal quase imperceptível junto do que temos praticado: banho de água ungida do Jordão, mapeamento genealógico das maldições hereditárias, correntes de fé, processos de regressão para cura interior, chave untada com óleo santo, banho de sal grosso, profetadas dos "santarados",  pirotecnias milagrosas, cantores “gospel”, show dos endemoninhados – com direito a entrevista, barganhas de todo tipo, espólio das carteiras e dos bens dos “dizimistas”, elementos judaicos no culto – bandeira de Israel, Estrela de Davi, Shofa, e tantas outras maluquices que daria para escrever um livro só com as bizarrices encontradas em “nossos” “templos” e “cultos”.  

Conclusão
Eu acredito que ainda há tempo para a igreja acordar e olhar para estas questões de forma séria e, sobretudo, pragmática. Se isto não for feito, todavia, veremos a doutrina espírita avançar cada vez mais em nosso país e continuar a “exportar” seguidores e práticas pelo mundo a fora. Por isso, reverter este quadro poderá ser desafio para a próxima geração, e não mais para a nossa...

É sabido que Chico Xavier era homem simples, sem vaidades, adepto da caridade, da solidariedade, do bem servir ao próximo. O Chico nunca foi um homem de posses, mas, ao contrário, doou em vida tudo o que recebeu para obras assistenciais e de caridade. Seria bom que alguns de nossos “apóstolos”, “missionários”, “bispos”, “astros gospel”, e outras “entidades” fizessem o mesmo, pois Jesus, a quem dizem seguir, não tinha onde reclinar a cabeça, e Paulo, afirmou: “tendo o que comer e com que nos vestir estejamos satisfeitos”. O Chico, justiça seja feita, nunca foi chique; mas os seus seguidores são...

Hoje, ser espírita é estar associado à vanguarda, a elite, a uma religião com caráter mais universal, que é tolerante, flexível, embasada, "conectada", que se preocupa com o próximo, com as obras de caridade, com as questões ambientais, políticas, ou seja, é uma religião que está alinhada com as preocupações e dilemas do homem contemporâneo. E nós, onde estamos? Ou seria melhor perguntar: e nós, em que século paramos?

Carlos Moreira

23 fevereiro 2011

DEMOCRACIA, MCDONALDS E TWITTER



Os deuses já não governam o Egito. As pirâmides começaram a ruir, os “faraós” estão sendo destronados e as múmias foram interrompidas em seu sono eterno.

Desde os dias de Menés até o governo de Osnir Mubarak, nunca se tinha visto no Vale do Nilo coisa igual. É a revolta dos felás, a ressurreição do camponês eloqüente!

O Egito dos governantes “embalsamados” está indo por água abaixo. Se eternizar no poder e governar absoluto a partir de um palácio inatingível nunca mais!

Na verdade, não é o ditador Osnir Mubarak que está perdendo o poder, é a tradição política milenar do crescente fértil que está sucumbindo às ondas do neoliberalismo ocidental.

Não são os fundamentalistas islâmicos que estão movendo a revolta popular e nem muito menos qualquer entidade metafísica muçulmana, judia ou cristã. São os “caras pintadas” egípcios que cansaram da ditadura e exigem a saída do presidente.

Ditaduras autocráticas regadas à valores questionáveis não fazem mais sentido no mundo contemporâneo e não estão na ordem do dia no Egito. É o secularismo ocidental que está derrubando Mubarak!

Não são os seguidores de Alá que estão promovendo a reviravolta no Cairo, e sim outro tipo de seguidores: os do Orkut, facebook e twitter. O povo clicou no ícone LIBERDADE.

A convulsão social no Egito é o começo da vitória do hambúrguer sobre o quibe. O que os exércitos ocidentais não conseguiram impor nos campos de batalha, a internet e o mcdonald’s estão conseguindo no âmbito cultural.

Digo isto porque embora Osnir Muabark seja um rebento do imperialismo norte-americano, como Sadan Hussein foi um dia, ele também é um representante legítimo dessas ditaduras violentas que floresceram naquela região ao longo de toda a história.

As manifestações populares no Egito, na Tunísia, na Síria ou onde quer que elas venham a aparecer são um sinal inconteste de que o mundo árabe está trocando o alcorão pela web 2.0 e pelo big-mac com bastante ketchup.

Os tempos mudaram, paradigmas estão sendo quebrados e outros ainda serão. Pelo visto, dentro de mais algum tempo o rigor das antigas tradições será engolido pela liberdade de expressão no mundo virtual.

E eu que preferia os livros ao notebook!

André Pessoa via Século XXI

21 fevereiro 2011

Dormindo com o Inimigo


Adoro polêmica! Quem me conhece sabe disso. Pensar é preciso e, para que isso aconteça, nada como levantar reflexões a respeito de temas que mexem com o consciente e o inconsciente de todas as sociedades, inclusive a nossa.

Dentro desse contexto, uma temática cujo debate é extremamente complexo é a questão do sexo no casamento e quando ele se torna pecado, mesmo respaldado pelo contrato que foi assinado no cartório ou a benção concedida pela igreja.

Há tantos que se preocupam com o sexo antes do casamento que, não raro, acabam esquecendo que existe sexo também no casamento! Primeiramente, para falar sobre o assunto, é preciso conceituá-lo. Aqui vou utilizar a experiência de estar há 20 anos ouvindo casais com os mais diversos tipos de problemas e conflitos na área sexual, o que se constitui vasto material para podermos refletir.Com vistas a chegarmos a algum ponto de “iluminação” da consciência, vou tentar dizer, logo de cara, o que não é sexo. Será mais fácil assim...

Sexo não é coito, ou seja, não é o ato em si, com carícias, preâmbulos, penetrações e orgasmo. Os animais fazem isso, mas não desfrutam da grandiosidade daquilo que Deus planejou para nós, humanos. Coito, é parte do sexo, mas ainda não é sexo! Sexo é encontro de corpo, sim, mas também de alma e de espírito. Sexo é algo muito mais profundo e complexo do que a grande maioria de nós entende ou usufrui. O sexo começa no olhar, no desejo acalentado, pacientemente. Depois ele passa pelas afinidades, complementaridades . Em seguida, vem a questão da “química”, do cheiro, do gosto, das formas. E então, finalmente, vem a parte espiritual.

Sim, sexo é coisa muito espiritual! Aliás, é mais espiritual do que muitas outras que imaginamos. Por isso, fazer sexo com alguém de “outro espírito” é deitar-se com uma pessoa que tem em sua natureza diferenças importantes da nossa e isso, obviamente, tem implicações para muito além do que se pensa ou se vê.

Foi por isso que Paulo, tratando do tema em sua epístola aos Coríntios, falou de forma aberta sobre os desdobramentos de um tipo de sexo que é casual, aquele realizado com a prostituta.

Na verdade, o raciocínio de Paulo não se prende à figura da prostituta em si, mas está focado no que podemos denominar de “espírito de prostituição”. Pessoas transmitem “espíritos” quando se relacionam intimamente. Por isso, há uniões que contaminam a alma da gente para o mal, pois cada pessoa carrega sua própria carga de “energia”, e isso a partir do que se construiu no ser.

Se você quiser aprender alguma coisa boa sobre sexo no casamento, não precisa ler livros que dão conselhos sobre o tema, sobretudo esses que estão aí nas prateleiras e que são, em sua esmagadora maioria, baboseira pura.

Faça o seguinte: abra a sua Bíblia e debruce-se sobre o livro de Cantares. Ali está a mais linda poesia sobre o sexo, com metáforas das mais ousadas e pertinentes que farão um leitor atento e inteligente, que consiga ir além da “letra”, apropriar-se das alegorias e, assim, aprender muita coisa bonita e poética para a vida a dois. Mas este não é um texto sobre sexo, e sim sobre o fato de se estar casado e fazer um tipo de sexo que é pecado diante de Deus. Isso é possível e mais comum do que se imagina.

Para entrar de cabeça na questão, vou usar apenas um texto dos muitos possíveis, pois ele vai me ajudar a pontuar o assunto. “Não se recusem um ao outro, exceto por mútuo consentimento e durante certo tempo, para se dedicarem à oração. Depois, unam-se de novo, para que Satanás não os tente por não terem domínio próprio.” 1ª Co. 7:5. O texto é riquíssimo, mas vou usar apenas esta parte dele: “Não se recusem um ao outro, exceto por mútuo consentimento...”.

Em primeiro lugar, vamos esclarecer algo importantíssimo: não se “recusar um ao outro” não trata apenas da incidência da relação, ou seja, da agenda sexual, mas de algo com implicações mais profundas.

Diferentemente do que, talvez, a maioria pense, não se recusa o parceiro apenas quando se diz a ele: “hoje não”, seja por que motivo for. Essa é apenas a forma mais usual.

Na verdade, podemos recusar alguém de muitas maneiras, inclusive inconscientemente. Aliás, normalmente recusamos os nossos parceiros enquanto fazemos sexo com eles! Recusa é algo que acontece não só nas proibições físicas – “isso não; aqui não; desse jeito não; não gosto assim;...”, mas também em nível emocional. Nesse segundo caso, o problema é subliminar, pois a resistência fica “presa à alma”, e, por vezes, até ao intelecto.

Mas há ainda outra frase-chave nessa citação de Paulo e nós precisamos explorá-la melhor: “mútuo consentimento”. Sabe o que significa? Não é tão simples como talvez pareça. Não trata apenas de concordar sobre local e hora de fazer sexo, mas de algo muito mais profundo, ou seja, das práticas, acordos e brincadeiras que o casal se permite fazer quando está nesse nível de intimidade sem que nenhum dos dois se constranja, sinta-se desrespeitado.

Então, usando o texto de Paulo como uma referência, posso concluir que sexo entre um casal é algo que é feito sem privação ou subterfúgios, em bom português: sem enrolação! E posso também arrematar que esse sexo é feito de forma prazerosa e digna – uma vez que um busca o que dá mais satisfação ao outro – ou seja, resumindo: sexo é um encontro profundo de um ser com outro ser.

No casamento, as relações sexuais se tornam pecado quando são feitas sem interesse, quando um dos cônjuges está ali por “obrigação”, apenas para “esvaziar” o desejo retido do outro. Sexo é pecado quando eu o faço com minha mente “vagando” por outros “ambientes” ou, pior, quando ela projeta alguém naquela “cena” que ali não está, nem poderia estar, ou seja, quando faço amor com um(a) e, ao mesmo tempo, penso em outro(a).

Sexo é pecado quando eu não respeito os “limites” do meu parceiro (a), estando apenas na busca pelo meu próprio prazer – ainda que isso traga desconforto e até dor a ele (a). Isso quebra a “regra” da consensualidade; é pecado!

Sexo é pecado quando eu preciso de objetos de erotização exteriores para produzir excitação. Fantasia é algo bom e saudável quando não ultrapassa os limites do bom senso, pois até mesmo o que supostamente dá prazer pode viciar e levar a alma a pulsões cada vez mais insustentáveis, onde o limite acaba beirando o absurdo.

Hoje há tantos recursos para produzir fetiche, como réplicas de pênis e vagina, cilindros para introdução, máscaras, algemas, filmes com aberrações, chicotes, que o prazer acaba se transferindo do corpo das pessoas para as coisas periféricas.

A experiência mostra que o vício na pornografia tem o poder de diluir a alma das pessoas, pois cria uma pulsão inconsciente que, depois, só concede ao corpo o prazer se a fantasia artificial se fizer presente. Não se pode esquecer, todavia, que ela é um estimulante sensorial virtual, mas não real. Talvez Seja bom para “crianças”, mas para adultos...??
Sexo é pecado quando eu não dou prazer ao outro. A coisa mais comum com a qual lido em meus aconselhamentos é ouvir das mulheres que elas jamais tiveram um orgasmo com seus parceiros em anos de casamento.

E o marmanjão, desfilando impoluto, fica achando: “Esse cara sou eu”! É pecado! Mostra o descaso para com o outro, o egoísmo explícito no ato, a falta de maturidade que me leva apenas a buscar meus 15 minutos de prazer em detrimento do outro que está há anos e anos na míngua, no deserto da excitação, na aridez do gozo.

Bem disse o cantor e compositor Cazuza, em circunstâncias similares: trata-se mesmo de “solidão a dois”. E mais... é pecado!

Lin Yutang, escritor chinês, afirma que: “É a minha conclusão que no Ocidente se pensa muito no sexo e muito pouco nas mulheres”.

Acredito que, sem nos preocuparmos sinceramente com o prazer do outro, jamais seremos felizes na cama com aquele (a) a quem dizemos amar. E creia-me: milhares de separações poderiam ser evitadas se esse tema fosse enfrentado de forma corajosa. Mas fazer o quê? Tem gente que prefere sonhar com o amante e dormir com o “inimigo”...



Carlos Moreira

19 fevereiro 2011

GUNPOWDER PLOT


Bertrand, Russel em seu livro “ABC da realidade”, diz que no dia 5 de novembro os ingleses comemoram o “gunpowder plot”, ou a “conspiração da pólvora”. O evento é uma espécie de festa cívica britânica.

Esta data é festejada para relembrar o empreendimento malsucedido de um conspirador chamado Guy Fawkes que intentou explodir o parlamento inglês no século XVI. Os ingleses comemoram a sobrevivência dos seus parlamentares que não foram apanhados de surpresa pelo atentado (acredite se quiser).

Denunciada a sinistra operação, o parlamento foi inspecionado, a pólvora, que seria usada na explosão também, e os parlamentares salvos sem nenhum arranhão. Em suma, a comemoração demonstra o respeito dos ingleses pelos seus representantes políticos.

A existência do parlamento inglês é, por incrível que isso possa parecer a um brasileiro, motivo de comemoração. No Brasil, entretanto, tal celebração seria impossível por motivos óbvios.

A história da política brasileira e do seu parlamento - digo isso com tristeza - é sinônimo de corrupção e entreguismo. Não temos qualquer motivo para comemorar os nossos parlamentares, ou a existência do senado e do congresso.

A bancada da câmara e do senado é uma vergonha nacional e uma instância totalmente desacreditada. A forma como os parlamentares defendem os seus interesses mesquinhos (principalmente os seus salários) é descabida e antiética.

A maneira vergonhosa como os nossos deputados e senadores confundem interesses públicos e privados é lastimável. A política brasileira enoja o cidadão honesto, torna-nos incrédulos quanto a mudanças e suja a imagem do nosso país no exterior.

Vida política no Brasil continua sendo sinônimo de bom emprego e porta para um possível enriquecimento ilícito. No nosso caso, temos motivo para lamentar, e não para comemorar a não explosão do congresso!

Contudo, eu mesmo não aprovaria uma possível explosão do congresso e do senado nacional. Por quê? Você já imaginou um pedaçinho do Sarney em cada canto do Brasil?

André Pessoa via Século XXI

15 fevereiro 2011

Protestando contra os Protestantes!


No segundo século da era cristã, os pais apostólicos discutiam entre si sobre a possibilidade ou não de haver salvação fora da igreja. Hoje, a questão inverteu-se e talvez seja mais correto perguntar se há possibilidade de alguém salvar-se estando dentro da igreja”. André Pessoa.

Nada como um dia atrás do outro e uma noite no meio... Nós Protestantes, herdeiros das tradições da Reforma do século XVI com seus “pilares”, sua teologia, suas confissões, suas teses, temos agora de conviver com uma “igreja” que possui um ambiente mil vezes mais insalubre do que o foi a Igreja de Roma na “idade das trevas”. 

E não adianta você dizer que “não é do clube”! Depois do esquartejamento que fizemos no Corpo de Cristo, transformando-o em mais de 30 mil denominações no mundo, ninguém diferencia protestantes de históricos, reformados, evangélicos, neopentecostais, e quem mais chegar! Para a grande maioria da população, é tudo farinha do mesmo saco, sempre viveram no mesmo barco...

Quando há alguns anos o então Cardeal Joseph Ratzinger, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, no Pontificado de João Paulo II, escreveu o Documento “Dominus Lesus”, reacendeu-se o axioma de que "Fora da Igreja Católica não há salvação". Na época, o documento foi considerado tão infeliz e inoportuno, que até os cardeais protestaram contra. Sem dúvida, tratava-se de um grande retrocesso quanto às questões abordadas pelo Concílio Vaticano II de 1961.

Hoje, se os Católicos quisessem se manifestar, protestar, redargüir, criticar, nós teríamos de ficar caladinhos e de orelhas abaixadas tamanhas são as barbáries realizadas nas “igrejas” ditas “evangélicas”. O “Show da Fé”, que já era um suplício interminável, virou, há muito, “Show de Horrores”! Sai capeta!

Quisera eu que a apologética de nossos dias fosse contra o axioma Católico da não possibilidade de haver salvação fora da Igreja de Roma. Isso seria como tirar pirulito de bebê. Hoje lutamos contra nós mesmos, é o chamado fogo amigo! Não é fogo santo não irmão! Fica melhor chamar de fogo estranho mesmo! Combater “apóstolos”, “evangelistas”, “missionários” e outros “entes” eclesiásticos juntamente com o que eles pregam tem se tornado tarefa quase hercúlea!

Você acha as indulgências e simonias o “fim da picada?”. O que me diz então da água ungida do Jordão, do mapeamento genealógico das maldições hereditárias, das correntes de fé, dos processos de regressão para cura interior, da chave untada com óleo santo, do banho de sal grosso, das profetadas dos "santarados", das pirotecnias milagrosas, dos cantores “gospel”, do show dos endemoninhados – com direito a entrevista, das barganhas de todo tipo, do espólio das carteiras e dos bens dos “dizimistas”, dos elementos judaicos no culto – bandeira de Israel, Estrela de Davi, Shofa, e tantas outras maluquices que daria para escrever um livro só com as bizarrices encontradas em “nossos” “templos” e “cultos”.     

Se Nietzsche, no século XIX, escreveu: “a descoberta da moral cristã é um acontecimento que não tem igual, uma verdadeira catástrofe", imagina o que ele diria da “igreja” de hoje!? É triste, mas nos tornamos a antítese de tudo o que Jesus encarnou como vida; tornamo-nos os praticantes do maior estelionato da fé que a sociedade humana já presenciou! 

Por isso, pode protestar, bater o pé, fazer o sinal da cruz, fechar os olhos, tapar os ouvidos, cerrar os lábios, correr de medo, gritar “tá amarrado!”, chamar o BOPE, faça qualquer coisa meu mano, mas me deixe “sair desse trem!”. Sinceramente, conversão dentro do que se tornou a “igreja evangélica” é algo tão adoecedor e esquizofrênico que só o que nos resta é rezar para que o pobre coitado que passar por esta “experimneto” – não seria melhor dizer expremimento? – sobreviva ao que ainda virá pela frente. É que para este a grande tribulação já começou...

Não sei mais o que é pior: se a afirmação ufanista de Roma de que a salvação só se dá dentro de “suas portas”, ou a constatação de que dentro das portas de nossas “igrejas” tá ruim de haver salvação! Eu, todavia, prefiro ficar com as Escrituras: “Em nenhum outro nome há salvação, porque debaixo do céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos”. At. 4:12. Só para lembrar: Igreja não salva! Jesus Cristo é a nossa salvação! 

PS: chocou-se com a imagem deste post? Não se impressione não, você vai vê-la muito mais por esses dias... "Quem tem ouvidos ouça o que o Espírito diz a Igreja!".

Carlos Moreira

14 fevereiro 2011

Longe dos "Templos"

Dois dos maiores ícones da filosofia e da psicanálise do século XIX foram grandes inimigos da religião: Sigmund Freud e Friedrich Nietzsche.

Freud via a religião como um sistema irracional, indemonstrável e de recusa à realidade. Nietzsche, por sua vez, repudiou os valores cristãos como “humanos, demasiadamente humanos” e chamou a moral cristã de “moral de escravos”.

Sigmund Freud afirmava que em todas as épocas, a imoralidade não encontrou menos apoio na religião do que na moralidade. Friedrich Nietzsche, bem mais enfático do que Freud, disse certa vez: “sempre tive a necessidade de lavar as mãos ao entrar em contato com as pessoas religiosas”.

A essa altura você deve está perguntando por que estes homens tão inteligentes nutriram tal repulsa pela religião e pela igreja? De onde vêm a indiferença de Freud e o ódio de Nietzsche?

Como pode um homem como Nietzsche, criado em lar protestante, filho de pastor, tornar-se um inimigo declarado da religião e da igreja? Que fatores teriam contribuído para essa aversão? Eu explico.

Para entender os motivos dessa indisposição de Freud e Nietzsche quanto à religião é preciso, logo de início, descartar certas explicações fantasiosas e infundadas como, por exemplo, dizer que satanás “cegou” a ambos para que não enxergassem a vontade de Deus. Deixe o diabo fora disso; desta vez ele não tem culpa nenhuma!

A aversão de Freud e Nietzsche pela religião é coisa deste mundo, obra de homens e não tem qualquer ligação com nenhum ser metafísico, habitante do inferno ou não. A atitude de ambos foi uma reação a uma religião castradora, hipócrita e mesquinha.

Nietzsche via no cristianismo uma negação da vontade para a vida e na igreja um ambiente propício ao florescimento das atitudes hipócritas e dissimuladas. “Se você quer respirar um pouco de ar puro não vá a um templo”, disse certa vez ao referir-se à igreja como coisa da gentalha.

Tanto Freud como Nietzsche perceberam que a igreja não resolvia os dilemas humanos, apenas ajudava a reprimir certos impulsos para o “pecado” que em pouco tempo voltavam a aflorar de forma mais avassaladora ainda. A igreja, neste caso, agia como uma empregada doméstica que ao invés de recolher a sujeira jogando-a no lixo, apenas empurrava-a para debaixo do tapete.

Reprimir impulsos não é o mesmo que controlá-los racionalmente. Um “cristão” produzido nestes termos não demora muito para “adornar a casa e receber mais sete demônios” com festa de boas vindas e de braços abertos.

Quem nunca se deparou com um “crente afastado dos caminhos do senhor” e que transgride dez vezes mais depois de descobrir que lhe ensinaram uma mentira e ter rompido totalmente com a igreja? O erro da igreja é querer ser certa demais quando não possui autoridade e nem moral para tanto!

O diabo não está fora das igrejas, pelo contrário, ele freqüenta os cultos e missas assiduamente e inspira certos bobalhões que não sabem o que estão dizendo quando proferem baboseiras sem fim dos seus púlpitos alienantes e desprezíveis!

Além disso, há também o problema da corrupção política dentro da igreja. Uma reunião de clérigos e uma de políticos sagazes e desonestos não tem muita diferença. A instituição eclesiástica e Brasília não destoam muito uma da outra. O templo e o plenário da câmara também não!

É a igreja que afasta as pessoas da igreja, e não o coitado do diabo, como dizem os clérigos muito “espirituais”. O cristianismo é como o mítico deus grego kronos que se alimentava dos seus próprios filhos matando-os quando deveria salvá-los!

No segundo século da era cristã, os pais apostólicos discutiam entre si sobre a possibilidade ou não de haver salvação dentro da igreja. Hoje a questão inverteu-se e talvez seja mais correto perguntar se há possibilidade de alguém salvar-se estando dentro da igreja. Nietzsche e Freud recomendariam: “por via das dúvidas, é melhor ficar longe dos templos”!

André Pessoa Via Século XXI

13 fevereiro 2011

Pior do que Envelhecer é Não se Tornar Adulto Nunca



Quando eu fiz 40 anos, um amigo me ligou e disse: “meus parabéns! Agora começarão os bons anos de sua vida!”. Eu fiquei animado, pois estava com aquela sensação de envelhecimento, começando a famosa "crise da meia idade". Aí, em seguida, ele arrematou “é meu amigo, aproveite os bons anos que virão, pois, os extraordinários, já se foram...”.



Na verdade, ninguém quer envelhecer. Por outro lado, na “sociedade da imagem”, desde que se tenham recursos financeiros, só envelhece quem quer. A medicina avançou tanto nesta área da estética que é difícil hoje você encontrar alguém que não tenha feito algum tipo de cirurgia. É implante de cabelo, lipoaspiração, restauração dentária, botox, silicone, depilação a laser, e um sem número de mimos disponíveis tanto para as mulheres quanto para os homens.  



De fato, é mesmo possível retardar o envelhecimento. Mas há um fenômeno que eu tenho observado na sociedade contemporânea: a desproporcionalidade entre o avanço da idade cronológica e o crescimento da maturidade existencial. A impressão que tenho é que quanto mais velhas as pessoas vão se tornando, mais imaturas vão ficando. E não é só isso... O problema parece ser bem mais freqüente em pessoas do sexo masculino do que nas do sexo feminino.   



Sinto-me confortável para afirmar isto, pois, como profissional de mercado, interajo com uma grande quantidade de pessoas, sobretudo em viagens. Fico abismado com o nível das conversas que travo em encontros dos mais diversos. Percebo nelas a existência de um profundo esvaziamento emocional, intelectual, cultural, social, político e religioso. É o que chamo de desidratação da alma. Praticamente todas as conversas giram em torno da seguinte "vala comum": dinheiro, status, mulher, balada, futebol e cachaça.

A prova dos nove, todavia, acontece no gabinete pastoral. Sistematicamente, por exemplo, ouço as mulheres se queixando da falta de conteúdos nos homens. Elas afirmam que eles estão sem perspectivas na vida, gravitam em torno de grandes futilidades, possuem uma vaidade exacerbada, além do total desconhecimento de questões elementares para se construir uma relação afetiva com um mínimo de propósito. Lembrei da Paula Toller, do Kid Abelha, quando em sua canção diz: “garotos perdem tempo pensando em brinquedos e proteção...”. Do lado das mulheres, o problema se repete, mas numa freqüência menor, eu diria.

Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino... agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.” 1ª Co. 13:11-12.

Observe o que Paulo está afirmando: ele está nos ensinando que o conhecimento de Deus e a maturidade existencial – holisticamente falando – são coisas que caminham de forma paralela. À medida que minha consciência vai sendo transformada pelos conteúdos do Reino de Deus, vou deixando para trás as “coisas de menino”, ou seja, as futilidades, vaidades e tolices próprias de quem ainda não chegou a tornar-se adulto, e passo a materializar outro tipo de comportamento. Preste atenção: pessoas que possuem um “centro de gravidade” mais adensado são justamente aquelas que, concomitantemente, desenvolveram uma espiritualidade sustentável.  

Num mundo feito apenas para os vencedores, nesta sociedade dos campeões, ter é a grande prioridade para o ser, pois é melhor vencer no mundo do que vencer o mundo! E assim, alienados pelo zeitgeist, presos a uma espiral umbigocêntrica que por fim nos leva a uma total incapacidade de nos enxergarmos, nos auto-discernirmos, vamos envelhecendo, mas, curiosamente, nunca chegamos a nos tornar adultos. Sobre isso, Hermann Hesse afirma: “Ninguém pode ver nem compreender nos outros o que ele próprio não tiver vivido”.

Tenho encontrado muito poucas pessoas que tem idade cronológica compatível com a maturidade existencial. Quando isto acontece, todavia, percebo que há algo em comum entre elas: o fato de estarem sendo capaz de evoluir no discernimento de Deus, de si mesmas e dos seus semelhantes.  

Carlos Moreira

10 fevereiro 2011

Bancos de Ferro


Procusto, personagem da mitologia grega, vivia perto da estrada de Elêusis. Costumava atrair para sua casa, de forma hospitaleira, viajantes solitários oferecendo-lhes abrigo para passar a noite. Ali ele possuía duas camas de ferro, uma menor e outra maior que, “caridosamente”, cedia ao visitante. Entretanto, depois que a vítima adormecia, Procusto a dominava para tentar adequá-la da forma exata ao tamanho do leito. Se o sujeito era alto, e passava das medidas, ele cortava os pés com um machado; se era baixo, esticava os seus membros com cordas e uma roldana. Ao final, mesmo mutilada, a pessoa acabava conformando-se adequadamente ao tamanho da cama, satisfazendo assim o mimetismo e o transtorno obsessivo compulsivo de Procusto.

Olhe para as igrejas dos nossos dias! Veja se os bancos não se parecem com “camas de ferro”? Veja se a mensagem que atrai as pessoas não parece com o “maravilhoso” convite de Procusto aos incautos? Triste, mas o cristianismo de hoje está apenas produzindo bonecos autômatos, ou seja, seres caricaturados, estereotipados, gente de uma rigidez e frieza cadavérica inigualáveis.

Com tristeza percebo que a mensagem, ao invés de fomentar a vida, semeia a morte, ao invés de produzir quebrantamento e pacificação interior, gera presunção e julgamento, ao invés de construir o ser, desconfigura a alma, ao invés de atrair as pessoas, produz nelas repugnância...


Ser crente, nesta geração, é ser engessado, alguém que foi customizado pela igreja como um

produto em série, alguns até vêm com chip! É gente sem consciência, sem senso crítico, apenas um membro de uma confraria de escolhidos que pensa que o sagrado pode ser cartelizado e o Evangelho, normatizado como se fosse uma franquia do divino. Ah moçada, quão distante tudo isso está da mensagem de salvação de Jesus!

Que seja utopia, mas eu desejo um cristianismo que produza gente de barro e não bonecos mecânicos, pois o barro nas mãos do oleiro ganha forma e pode ser moldado novamente, caso o objeto quebre ou perca o seu valor.

Gente de barro é entretecida nas mãos do arte-são, daquEle que cria o “vaso” com vistas a dar-lhe um propósito e um significado. É obra da manufatura diária da vida, que pacientemente constrói coisas boas e belas. Chega de esticar e cortar as pessoas para torná-las iguais, um fiel padrão! Isso pode até fazer sentido na nossa cabeça, adoecida pela religião, mas jamais passou, nem de longe, pelo coração do Pai que está nos céus.

Carlos Moreira

07 fevereiro 2011

Íntimo, Pessoal e Intransferível



A lenda do Rei Artur está presente nas histórias medievais e romances britânicos. Seu reino teria se estabelecido através da resistência contra os invasores saxões no início do século VI. Reza a história que Artur teria sido o criador de uma cidade ideal, Camelot, onde a justiça e a paz imperavam.

Mas para manter a ordem, o Rei dispunha dos 12 Cavaleiros da Távola Redonda e contava ainda com a ajuda adicional de Taliesin, mas conhecido como Merlim. Na verdade, Merlim era um título dado ao sacerdote mais graduado da religião antiga, ele era um mago, um conselheiro que ajudava Artur a tomar decisões.

Estou usando a figura de Merlim não só pela sua imensa popularidade literária, mas, sobretudo, pela função que ele realizava – a de ser um “intermediário” entre o natural e o sobrenatural. Nos dias de hoje, a expressão que melhor qualificaria esta prática seria o xamanismo, pois faz uso e sincretiza experiências etnomédicas, mágicas, metafísicas, religiosas, filosóficas, transe e metamorfose. No mundo contemporâneo ele desponta como o único caminho para o desenvolvimento de uma espiritualidade universal. De forma simplista, expande a mente para perceber mistérios, busca o autoconhecimento, a religação com o sagrado, a natureza e as energias puras, além do aprendizado da sabedoria dos antigos.   


Vendo-se o povo diante dos trovões e dos relâmpagos, e do som da trombeta e do monte fumegando, todos tremeram assustados. Ficaram à distância e disseram a Moisés: "Fala tu mesmo conosco, e ouviremos. Mas que Deus não fale conosco, para que não morramos". Ex. 20:18-19


Intermediar o sagrado não é coisa nova, nem muito menos surgiu com as práticas perversas do neopentecostalismo. “Traficar influência religiosa” é algo que está presente na origem dos povos. Mudam os nomes dos representantes, de acordo com o culto ou a relgião, mas suas funções são basicamente as mesmas. Eles são xamãs, pajés, oráculos, chefes de terreiro, babalorixás, magos, profetas, feiticeiros, sacerdotes, aiatolás, dentre muitos outros. Citei os mais conhecidos para resumir a lista.
    
Pois bem, entre os Hebreus, tenho desconfiança, a prática começou no texto descrito acima. Lê-lo sem se aperceber de seu contexto sócio-histórico-cultural rouba-lhe suas implicações mais profundas. A Perícope do Sinai – pós-acontecimentos da saída do Egito – revela a manifestação sobrenatural e espantosa do Deus dos Patriarcas através de proezas e milagres realizados por intermédio de Moisés. Deus estava chamando, novamente, para junto de Si o Seu povo, para com ele estabelecer uma aliança eterna, um relacionamento. 


Ora, aquela geração havia se esquecido quase que completamente quem era Eloim. Os especialistas afirmam que durante um período de aproximadamente 400 anos os Hebreus estiveram não só sob a escravidão, mas também sobre a influência do Egito, uma cultura extremamente politeísta. Eles não possuíam esperança, nem sonhos, nem alegria, existiam, não viviam, eram subvencionados por uma “ração”, como se fossem animais, pois trabalhavam em troca de comida. 


Aí de repente, “do nada”, surge Moisés dizendo que vem em nome do Deus “Eu Sou”. Ele promete aquela gente a libertação do poderio incalculável do Faraó. Mas a verdade é que, em sã consciência, ninguém o levou a sério. Só depois de tudo o que “ele realizou” pela “mão” do Todo Poderoso, é que os fatos começaram a mudar de figura. A história vocês conhecem... Voltemos ao Sinai... Deus está ali, presente, Eloim os quer para Si, Ele se revela não a um, ou a outro, mas a todos! É o momento da redenção, da restauração, da libertação! E o que o povo faz diante de tal apelo, desta demonstração de amor? Empurram para Moisés a possiblidade de se restabelecer o relacionamento que, certamente, mudaria para sempre suas vidas sofridas, desgastadas, mortas. 


Olho para os nossos dias... Como tudo isso é atual! Como nós delegamos a outros aquilo que deveríamos fazer. Como imaginamos que só os “escolhidos”, os “ungidos”, os “separados”, devem “subir a montanha” e ir ao encontro de Deus. Não queremos pagar o preço do relacionamento íntimo, não queremos os “40 dias” de comunhão intensa, de revelação, de conforto e de confronto, de tudo o que faz o “rosto resplandecer e a glória do Senhor se manifestar em nós e através de nós!”. Não! Quermeos a “comida pronta”, a palavra “mastigada”, é a religião dos atravessadores. Por isso boa parte do Povo de Deus vive de comer “ração”, na miséria material e espritual, continua sendo escravizado pelo “Egito” – mundo – e debaixo da opressão de “Faraó” – satanás.     

Na verdade, o que temos aqui é algo de natureza fenomenológica, ou seja, parece haver no inconsciente coletivo da humanidade uma herança comportamental que os leva a transferir a outros toda e qualquer possibilidade de interação com o sagrado. É a terceirização da espiritualidade! É como se o cara dissesse: vá lá você! Faça por mim, ore por mim, pregue por mim, seja de Deus por mim, testemunhe por mim, viva por mim, creia por mim! O problema é que Deus não nos trata no atacado, Deus nos chama a um relacionamento íntimo, pessoal e intransferível. Este serviço não dá para ser prestado, precisa ser experienciado na vida!  


Olho com tristeza a “igreja” de nossos dias. A grande maioria dos “figurões” que estão na mídia, ainda que adorados por muitos – “apóstolos”, “evangelistas”, “missionários”, “bispos” – nada mais são do que embusteiros, espertalhões, aproveitadores, valem-se da ignorância do povo e de sua boa fé para ludibriá-los. E aí vem esse negócio de "cobertura espiritual". Ai meu Deus, quanta maluquice! Eu lhe desafio a, numa exegese séria, me mostrar isso nas Escrituras. No fim, o que temos é mais um mecanismos de manipulação – do lado dos líderes, e de transferência de responsabilidades  –  do lado do povo. Mas há quem goste...  


Finalizo lhe dizendo que não foi a toa que Jesus, o Deus Encarnado, quando se manifestou no deserto da palestina, ainda carregava em Si o mesmo apelo do Sinai: “vinde a mim”... Chega de tanta enganação! Lembrem-se de Lutero, usando o apóstolo Pedro “Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus...”. 1ª Pe. 2:9. A Cruz foi erigida, o Sangue foi aspergido, o véu foi rasgado e o Espírito derramado, Deus te fez Sacerdote, Deus te chama a entrar em Sua intimidade e chamá-lo de Pai. Não permita que atravessadores entrem neste caminho, não tercerize este privilégio, só seu, nem com homens, nem com anjos, nem com ninguém!   

Carlos Moreira

04 fevereiro 2011

Valdomiro Santiago na Isto é: O homem multiplicador de "Fiéis"


Com discurso de homem do povo, carisma inato e um aparato de comunicação competente, Valdemiro Santiago faz sua Mundial ascender ao topo das igrejas neopentecostais do Brasil





Rodrigo Cardoso e João Loes


Fotos Pedro Dias/Agência ISTOÉ


Com microfone em punho, Valdemiro Santiago de Oliveira, todo-poderoso líder da Igreja Mundial do Poder de Deus (IMPD), caminha bambeando de um lado para outro do altar fincado bem no centro de um galpão de 18 mil metros quadrados, localizado no Brás, bairro da região central de São Paulo. Dez mil pessoas se aglomeram ao redor do autointitulado apóstolo, em estado de atenção e êxtase, à espera de uma palavra, um toque, um abraço. Com o rebanho em suas mãos, e um timing digno de showman, ele chora, gargalha, transpira. Está entregue à multidão. A voz rouca sai carregada de ironia e ornamentada por um sorriso de canto de boca. “Está um congestionamento aqui fora. Ouvi dizer que acontece uma feira na redondeza!”, diz. Mas não há feira nenhuma. O movimento na região é provocado pelos concorridos cultos desse mineiro de 47 anos, natural de Cisneiros, distrito de Palma, a 400 quilômetros de Belo Horizonte. E Santiago sabe muito bem disso. Há 30 anos no movimento neopentecostal brasileiro, segmento que mais cresce no Brasil (deve chegar a 40 milhões de adeptos no novo Censo), o homem forte da Mundial é o mais fulgurante fenômeno religioso do Brasil atualmente. Sua identificação direta com a massa – é negro, tem sotaque caipira e português falho, trabalhou na roça e passou fome – o coloca nos braços humildes e carentes daqueles que procuram uma solução espiritual para as mazelas da vida.

“Quem me viu na tevê? Quem foi a Interlagos?”, questiona Santiago, enquanto os fiéis, contidos por obreiros, se debatem e gritam em sua direção. No primeiro dia de 2011, o religioso ganhou minutos preciosos em rede nacional por causa da massa impressionante de discípulos que conseguiu arregimentar em pleno 1º de janeiro, vinda de todos os cantos do Brasil para celebrar com ele no autódromo de Interlagos. Segundo os organizadores do evento, havia lá 2,3 milhões de pessoas. Nos dias 9 e 11 de janeiro, quando a reportagem de ISTOÉ acompanhou os cultos na sede mundial da IMPD, no Brás, uma antiga fábrica comprada por R$ 60 milhões em 60 parcelas de R$ 1 milhão, o apóstolo faturou sobre essa exposição em horário nobre. “Ninguém pode dizer que sou um sujeito dotado de uma inteligência, uma sabedoria”, disse Santiago à ISTOÉ, currículo escolar findo no quinto ano do ensino fundamental, mas alinhado em um terno bem cortado, gravata, camisa com abotoaduras douradas e sapatos tamanho 44 impecáveis. “Quem olha a minha vida e faz uma análise não tem como não glorificar Deus.”


 

Glória: O ex-roceiro, que cuidava de marrecos e foi viciado em drogas, é ovacionado por 2,3 milhões de pessoas, em Interlagos, no primeiro dia de 2011
 

De fato, o garoto que perdeu a mãe aos 12 anos e caminhava oito quilômetros por dia para levar marmita para os familiares na roça lidera, hoje, um império religioso que conta com três mil igrejas espalhadas pela América do Sul e do Norte, Europa, Ásia e África e 4,5 milhões de fiéis, de acordo com dados da própria IMPD (leia ao lado quadro comparativo com outras denominações evangélicas). Treze anos depois de fundar a Mundial, o homem que gosta de cultivar a fama de matuto mora em um condomínio de luxo em Barueri, na Grande São Paulo, e tem na garagem três carros importados blindados – uma Land Rover, um Toyota e um Peugeot. Motoristas e seguranças particulares estão sempre à sua disposição. Helicópteros e um jato particular também. A Igreja Mundial, por sua vez, tem inaugurado um novo templo por semana e honra, mensalmente, uma despesa em torno de R$ 40 milhões. O dinheiro da igreja vem, principalmente, do dízimo arrecadado. Membros da IMPD estimam receber de doação em seus cultos uma média de R$ 10 por fiel. Há, ainda, envelopes nas cores ouro, prata e bronze. Pastores afirmam que a diferenciação não está diretamente ligada ao valor a ser dado à igreja. Segundo eles, cada tipo de envelope contém uma mensagem diferente. Nesse primeiro mês de 2011, o apóstolo reforçou o pedido por doações argumentando despesas com emissoras de tevê e rádio. “Ano novo, contratos novos e reajustados... Essa semana preciso muito de sua ajuda. Quem pode trazer até terça-feira R$ 100?”, perguntou Santiago. A quantia foi diminuindo à medida que o tempo ia passando. “E uma oferta mínima de R$ 30? Quem puder, fique de pé que o obreiro irá dar o envelope.”

 

Cura: O milagre é o carro-chefe da Igreja Mundial. Pessoas com câncer e até cadeirantes testemunham ter se curado com a intervenção de Santiago e seus pastores
 

É a mística de milagreiro de Santiago a chave de seu sucesso e a responsável pelo fenômeno da multiplicação de fiéis à sua volta. E a televisão amplifica em doses continentais esse poder de comunicação inato do líder evangélico. Atualmente ele ocupa 22 horas diárias na programação da Rede 21, que pertence ao grupo Bandeirantes, ao custo de R$ 6 milhões mensais. Com mais R$ 101 mil por mês, pagos à Multichoice, empresa sul-africana distribuidora de sinal, também está no ar em Angola, Moçambique, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe, Líbia, Zimbábue e Botswana. Na telinha, o que se vê são os cultos de Santiago em seus templos. Para isso, a performance do pastor é acompanhada, minuto a minuto, por fotógrafo e uma equipe de cinegrafistas, que registram tudo para ser divulgado, além da tevê, no jornal, na revista e na rádio da igreja. Na África do Sul, a Mundial possui uma hora de programação na TV Soweto, ao custo de R$ 59 mil mensais. Em Maputo, a capital de Moçambique, uma tevê e uma rádio já estão sob o domínio da corrente evangélica do ex-roceiro, fissurado, segundo palavras dos próprios membros da igreja, por se comunicar com os súditos via tevê. Afinal, se em um templo como o do Brás o apóstolo consegue falar para 30 mil pessoas, no ar, citando apenas os que possuem antena parabólica no Brasil, ele chega a 25 milhões de lares via Rede 21.

Não e à toa que, anunciados pela telinha, seus eventos estão sempre lotados. “Aquela máxima da publicidade de que uma imagem vale mais do que mil palavras se aplica muito bem a Valdemiro”, afirma Ronaldo Didini, ex-membro da cúpula da Universal e braço-direito de Santiago, que responde pela estratégia de mídia da igreja. Além dele, são dirigentes da Mundial um consultor financeiro, também ex-Universal, e três deputados eleitos no último pleito – dois federais (José Olímpio, PP/SP e Francisco Floriano, PR/RJ) e um estadual (Rodrigo Moraes, PSC/SP). “As coisas são cada vez mais rápidas e profissionalizadas na Mundial”, diz o pesquisador Ricardo Bitun, autor da tese “Igreja Mundial do Poder de Deus: Rupturas e Continuidades no Campo Religioso Neopentecostal”, defendida na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Isso ocorre, em grande parte, por conta de um fenômeno conhecido como nomadismo religioso. Se durante muito tempo a Igreja Católica era a maior fornecedora de ovelhas ao rebanho pentecostal, agora esses últimos trocam de fiéis entre si. “Meu trabalho é o altar; meu negócio é multiplicar as almas”, diz Santiago, que também fatura com a crise de igrejas como a Renascer em Cristo, por exemplo, que perdeu em 2010 seus discípulos mais ilustres, o jogador de futebol Kaká e sua mulher, Caroline Celico.

A ascensão de Santiago ao olimpo dos líderes religiosos do Brasil começou a ser moldada em 1976, quando, aos 16 anos, ele se converteu ao protestantismo. Naquela época, o garoto revoltado e de difícil trato, que em Cisneiros cuidava de marrecos, arava a terra e colhia ovos de anu para fazer omelete, morava com um dos 12 irmãos na mineira Juiz de Fora. Nessa cidade, trabalhava como pedreiro e levava uma vida desregrada. Dormia muitas noites na calçada e era viciado em drogas – ele se limita a dizer que consumia “álcool e substâncias sintéticas em forma de comprimidos”. Até que um pastor lhe estendeu a mão e Santiago passou a pregar. Foi obreiro, pastor, bispo e membro da cúpula da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). Nos templos de Edir Macedo, atuou por 18 anos e se desligou em 1997, depois de um suposto desentendimento com o líder evangélico. Já havia, porém, decorado a cartilha de seu mentor. Pesquisador da área da sociologia da religião, Ricardo Mariano afirma que as crenças e práticas mágico-religiosas da Mundial são uma cópia da Universal. Tanto que até o nome da igreja de Santiago, Igreja Mundial do Poder de Deus, é uma evidente inspiração na primeira casa: Igreja Universal de Reino de Deus. Perspicaz, o religioso caipira foi beber da fonte que já havia sido aprovada pelo público. Tanto que, além de convidar parte da cúpula da IURD, atraiu também dezenas de pastores, prática que adotou até um ano atrás, quando membros da Mundial começaram a temer que houvesse “universais” infiltrados em suas fileiras.

No altar da igreja que fundou em 1998 Valdemiro passou a receber portadores do vírus da Aids, doentes de câncer e até cadeirantes desenganados pela medicina. As pessoas em cadeira de roda são, até hoje, um dos campeões de audiência. É comum encontrar no templo fiéis carregando para o alto cadeiras de roda, num gesto explícito de libertação. Em um programa no início de janeiro, o apóstolo protagonizou, via tevê, uma situação do tipo. Ao seu lado, caminhando, um ex-paralítico afirmava ter permanecido imóvel por 15 anos. A reportagem de ISTOÉ tentou contato com esse homem, mas membros da cúpula da Mundial disseram ser impossível localizá-lo, pois as fichas de identificação ainda não estão informatizadas e há muitos casos como o dele.


“Meu trabalho é o altar; meu negócio é multiplicar as almas” Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial do Poder de Deus

O pastor mineiro usa como nenhuma outra liderança pentecostal os depoimentos de enfermos e a evocação da cura divina. Juntos, eles provocam uma catarse espiritual. Os fiéis da IMPD fazem fila para testemunhar, no altar ao lado do apóstolo e com exames médicos em punho, que a medicina já os havia desenganado, mas que a intervenção milagrosa os salvou. “Na Igreja Mundial, o toque no corpo de Santiago é muito valorizado”, diz o sociólogo da religião Flávio Pierucci, da Universidade de São Paulo (USP). Aos 61 anos, a católica catarinense Aledir Lachewtz, 61 anos, levou fotos e roupas de sua tia octogenária que sofria com um edema pulmonar para serem abençoadas em um culto na IMPD. “Os médicos diziam que não tinha mais jeito”, conta Aledir. “Mas, depois das bênçãos, novos exames não apontaram mais nada. O apóstolo tem muito poder de cura.” Essa espécie de pronto-socorro espiritual, como define o teólogo Edin Abumansur, da PUC-SP, floresce de modo particular na Mundial. Enquanto Santiago prega, dezenas de placas com os dizeres “Aqui tem milagre” são levantadas por obreiros para auxiliá-lo. Selecionado previamente e de posse de exames médicos que revelariam primeiro a enfermidade e, em seguida, o desaparecimento dela – chamado na IMPD de “o antes e o depois” –, o fiel é alçado ao microfone ao lado do pastor. E é nessa hora que o líder da Igreja Mundial vira astro.

Do alto de seu 1,90 e 103 quilos (chegou a ter 153, mas emagreceu após uma cirurgia bariátrica, há oito anos), o apóstolo grampeia o rosto da pessoa contra o seu peito. Abraça, chora e grita, como fez com a mãe que atribuiu a cura de sua filha de 6 anos, que voltou a andar e a falar contrariando prognósticos médicos, segundo ela, à fé e às orações feitas na IMPD. “Esse Deus é poderoooso! Isso é para sacudir o barraco do cramunhão e botar pra baixo!”, berra o religioso. Ricardo Mariano, professor do programa de pós-graduação em ciências sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e um dos maiores especialistas do Brasil em movimento neopentecostal, contextualiza: “A ênfase pentecostal na cura divina já tem mais de 60 anos e foi uma das principais responsáveis pelo crescimento desse movimento religioso na América Latina e na África. Desde então, constitui uma das iscas mais atraentes de potenciais adeptos aos templos.”



Além da eloquência com que evangeliza, Santiago ficou conhecido por usar chapéus típicos de quem se criou no meio do mato. Assim também é visto em seus finais de semana, que acontecem, como ele diz, às quartas-feiras. Nesses dias, ele se tranca em um sítio, em Santa Isabel, a 50 quilômetros de São Paulo. Lá, desfruta de um pesqueiro, da piscina e do campo de futebol, onde organiza e disputa campeonatos entre times formados por membros de seu ministério. “Mas o que gosto mesmo é de sentar na beira do rio, com minha varinha de pescar”, diz. “Sou um sujeito de pouca educação. É uma coisa de chucro, de caipira”, completa ele, uma espécie de Tim Maia do altar, que passa boa parte do culto distribuindo broncas em obreiros, cinegrafistas e músicos que o acompanham. “Ô, oreiúdo (orelhudo), abre passagem para a mulher chegar até aqui”, disse o chefe da IMPD a um pastor, no culto do domingo 9, provocando gargalhadas nos súditos.

Nem mesmo a esposa, a bispa Franciléia, com quem vive há 26 anos, e as duas filhas do casal, Rachel, 25, e Juliana, 23, que também trabalham em prol do ministério, escapam de seus pitos. O apóstolo também é conhecido por ser incansável na rotina de sua Mundial. Há dias em que nem volta para casa. “Tenho um quarto na igreja”, conta Santiago, referindo-se ao templo do Brás. “Em casa, tenho dormido três, quatro vezes no mês”, completa ele, que diz desfrutar, por noite, de apenas quatro horas de sono. Membro da IMPD, Fernando Trizi reforça o fato. “Antigamente, muitos fiéis dormiam aqui na igreja. E, algumas vezes, o apóstolo acordava de madrugada, descia do quarto e, de pijama, orava com eles.” Ao valorizar a ingenuidade e a simplicidade, o religioso prosperou. “O que chama mais a atenção é a emergência de uma autoridade religiosa pentecostal de expressão nacional negra, tal como o restante da cúpula da igreja”, diz Mariano, autor de “Neopentecostais: Sociologia do Novo Pentecostalismo no Brasil” (Edições Loyola, 1999). Ao contrário de outras neopentecostais de peso, como a Renascer e a Universal, que ficaram mais requintadas em relação ao público que as frequenta, prometendo prosperidade àqueles que também desejam ascensão material, a Mundial tem acolhido a classe menos favorecida, um aglomerado de gente humilde que não se identifica mais com as outras denominações.




Na IMPD, porém, essas pessoas enxergam em seu líder uma figura que, mesmo de terno e gravata e sob os holofotes, fala a língua delas. Foi por meio dessa habilidade inata que muitas personalidades deixaram para trás o passado sofrido e se tornaram notórias. “O Valdemiro é como o Silvio Santos ou o Lula. O camelô que deu certo, mas nunca deixou de ser camelô. O metalúrgico que virou presidente da República, mas não deixou de ser metalúrgico”, compara Bitun. Os astro evangélico promete milagres como se contasse um causo. Apelo irresistível aos corações aflitos.



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